segunda-feira, 31 de agosto de 2009

XXXIV - Acho tão Natural que não se Pense



Acho tão natural que não se pense
Que me ponho a rir às vezes, sozinho,
Não sei bem de quê, mas é de qualquer cousa
Que tem que ver com haver gente que pensa ...

Que pensará o meu muro da minha sombra?
Pergunto-me às vezes isto até dar por mim
A perguntar-me cousas. . .
E então desagrado-me, e incomodo-me
Como se desse por mim com um pé dormente. . .

Que pensará isto de aquilo?
Nada pensa nada.
Terá a terra consciência das pedras e plantas que tem?
Se ela a tiver, que a tenha...
Que me importa isso a mim?
Se eu pensasse nessas cousas,
Deixaria de ver as árvores e as plantas
E deixava de ver a Terra,
Para ver só os meus pensamentos ...
Entristecia e ficava às escuras.
E assim, sem pensar tenho a Terra e o Céu.

Alberto Caeiro


Notas:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Alberto_Caeiro
Este é um dos 49 poemas que formam "O Guardador de Rebanho" escrito por Alberto Caeiro em 1914 e publicado em 1925 na revista Athena.

domingo, 30 de agosto de 2009

Because the Night


Take me now baby here as I am
Pull me close, try and understand
Ddesire is hunger is the fire I breathe
Love is a banquet on which we feed

Come on now try and understand
The way I feel when I'm in your hands
Take my hand come undercover
they can't hurt you now,
Can't hurt you now, can't hurt you now
Because the night belongs to lovers
Because the night belongs to lust
Because the night belongs to lovers
Because the night belongs to us

Have I doubt when I'm alone
Love is a ring, the telephone
Love is an angel disguised as lust
Here in our bed until the morning comes

Come on now try and understand
The way I feel under your command
Take my hand as the sun descends
They can't touch you now,
Can't touch you now, can't touch you now
Because the night belongs to lovers ...

With love we sleep
With doubt the vicious circle
Turn and burns
Without you I cannot live
Forgive, the yearning burning
I believe it's time, too real to feel
So touch me now, touch me now, touch me now
Because the night belongs to lovers ...

Because tonight there are two lovers
If we believe in the night we trust
Because tonight there are two lovers ...

Patti Smith & Bruce Springsteen

Notas:
Música composta por Patti Smith e Bruce Springsteen, lançada no album Easter (Patti Smith Group, 1978)
Uma bela gravação desta música foi feita pelo grupo americano 10.000 Maniacs.

Song of Myself (Fragment)


I celebrate myself, and sing myself,
And what I assume you shall assume,
For every atom belonging to me as good belongs to you.

I loafe and invite my soul,
I lean and loafe at my ease observing a spear of summer grass.

My tongue, every atom of my blood, form'd from this soil, this air,
Born here of parents born here from parents the same, and their
parents the same,
I, now thirty-seven years old in perfect health begin,
Hoping to cease not till death.

Creeds and schools in abeyance,
Retiring back a while sufficed at what they are, but never forgotten,
I harbor for good or bad, I permit to speak at every hazard,
Nature without check with original energy.

Walt Whitman

One Art



The art of losing isn't hard to master;
so many things seem filled with the intent
to be lost that their loss is no disaster,

Lose something every day. Accept the fluster
of lost door keys, the hour badly spent.
The art of losing isn't hard to master.

Then practice losing farther, losing faster:
places, and names, and where it was you meant
to travel. None of these will bring disaster.

I lost my mother's watch. And look! my last, or
next-to-last, of three beloved houses went.
The art of losing isn't hard to master.

I lost two cities, lovely ones. And, vaster,
some realms I owned, two rivers, a continent.
I miss them, but it wasn't a disaster.

- Even losing you (the joking voice, a gesture
I love) I shan't have lied. It's evident
the art of losing's not too hard to master
though it may look like (Write it!) a disaster.

Elizabeth Bishop

Notas:

Esse poema foi recitado pela atriz Cameron Diaz no filme "In Her Shoes" (2005).


quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Poética


Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
protocolo e manifestações de apreço ao Sr. Diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário
o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas

Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de excepção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis

Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora
de si mesmo
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário
do amante exemplar com cem modelos de cartas
e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.

Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare

- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.

Manuel Bandeira
Libertinagem (1930)

Notas:

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

La Servante au Grand Coeur



La servante au grand coeur dont vous étiez jalouse,
Et qui dort son sommeil sous une humble pelouse,
Nous devrions pourtant lui porter quelques fleurs.
Les morts, les pauvres morts, ont de grandes douleurs,
Et quand octobre souffle, émondeur des vieux arbres,
Son vent mélancolique à l'entour de leurs marbres,
Certes, ils doivent trouver les vivants bien ingrats,
A dormir, comme ils font, chaudement dans leurs draps,
Tandis que, dévorés de noires songeries,
Sans compagnon de lit, sans bonnes causeries,
Vieux squelettes gelés travaillés par le ver,
Ils sentent s'égoutter les neiges de l'hiver
Et le siècle couler, sans qu'amis ni famille
Remplacent les lambeaux qui pendent à leur grille.

Lorsque la bûche siffle et chante, si le soir,
Calme, dans le fauteuil je la voyais s'asseoir,
Si, par une nuit bleue et froide de décembre,
Je la trouvais tapie en un coin de ma chambre,
Grave, et venant du fond de son lit éternel
Couver l'enfant grandi de son oeil maternel,
Que pourrais-je répondre à cette âme pieuse,
Voyant tomber des pleurs de sa paupière creuse?

Charles Baudelaire, Les Fleurs du mal, 1857


Notas:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Baudelaire
http://pt.wikipedia.org/wiki/As_Flores_do_Mal

Esse poema foi musicado por Léo Ferré, poeta, cantor e compositor francês que lançou diversos discos com poemas musicados de poetas franceses.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Cruzou por mim, veinho ter comigo, numa rua da Baixa



Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa
Aquele homem mal vestido, pedinte por profissão que se lhe vê na cara,
Que simpatiza comigo e eu simpatizo com ele;
E reciprocamente, num gesto largo, transbordante, dei-lhe tudo quanto tinha
(Exceto, naturalmente, o que estava na algibeira onde trago mais dinheiro:
Não sou parvo nem romancista russo, aplicado,
E romantismo, sim, mas devagar...).

Sinto uma simpatia por essa gente toda,
Sobretudo quando não merece simpatia.
Sim, eu sou também vadio e pedinte,
E sou-o também por minha culpa.
Ser vadio e pedinte não é ser vadio e pedinte:

É estar ao lado da escala social,
É não ser adaptável às normas da vida,
As normas reais ou sentimentais da vida -
Não ser Juiz do Supremo, empregado certo, prostituta,
Não ser pobre a valer, operário explorado,
Não ser doente de uma doença incurável,
Não ser sedento da justiça, ou capitão de cavalaria,
Não ser, enfim, aquelas pessoas sociais dos novelistas
Que se fartam de letras porque tem razão para chorar lagrimas,
E se revoltam contra a vida social porque tem razão para isso supor.

Não: tudo menos ter razão!
Tudo menos importar-se com a humanidade!
Tudo menos ceder ao humanitarismo!
De que serve uma sensação se ha uma razão exterior a ela?
Sim, ser vadio e pedinte, como eu sou,
Não é ser vadio e pedinte, o que é corrente:
É ser isolado na alma, e isso é que é ser vadio,
É ter que pedir aos dias que passem, e nos deixem,
e isso é que é ser pedinte.

Tudo o mais é estúpido como um Dostoiewski ou um Gorki.
Tudo o mais é ter fome ou não ter o que vestir.
E, mesmo que isso aconteça, isso acontece a tanta gente
Que nem vale a pena ter pena da gente a quem isso acontece.

Sou vadio e pedinte a valer, isto é, no sentido translato,
E estou-me rebolando numa grande caridade por mim.

Coitado do Álvaro de Campos!
Tão isolado na vida! Tão deprimido nas sensações!
Coitado dele, enfiado na poltrona da sua melancolia!
Coitado dele, que com lágrimas (autenticas) nos olhos,
Deu hoje, num gesto largo, liberal e moscovita,
Tudo quanto tinha, na algibeira em que tinha olhos tristes por profissão

Coitado do Álvaro de Campos, com quem ninguém se importa!
Coitado dele que tem tanta pena de si mesmo! E, sim, coitado dele!
Mais coitado dele que de muitos que são vadios e vadiam,
Que são pedintes e pedem,
Porque a alma humana é um abismo. Eu é que sei. Coitado dele!

Que bom poder-me revoltar num comício dentro de minha alma!
Mas até nem parvo sou!
Nem tenho a defesa de poder ter opiniões sociais.
Não tenho, mesmo, defesa nenhuma: sou lúcido.

Não me queiram converter a convicção: sou lúcido! Já disse: sou lúcido.
Nada de estéticas com coração: sou lúcido.
Merda! Sou lúcido.

Álvaro de Campos


Notas: Álvaro de Campos é um dos heterônimos de Fernando Pessoa.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Landslide


I took my love, I took it down
Climbed a mountain and I turned around
I saw my reflection in the snow covered hills
till the landslide brought me down

Oh, mirror in the sky
What is love
Can the child within my heart rise above
Can I sail thru the changing ocean tides
Can I handle the seasons of my life

Well, I've been afraid of changing
cause I've built my life around you
But time makes you bolder
Children get older
Im getting older too

Oh, take my love, take it down
Climb a mountain and turn around
If you see my reflection in the snow covered hills
Well the landslide will bring it down

If you see my reflection in the snow covered hills
Well maybe the landslide will bring it down.

Stevie Nicks

Notas: Música lançada pelo Fleetwood Mac no allbum de estréia da Banda em 1975.


domingo, 16 de agosto de 2009

And Death Shall Have No Dominion


And death shall have no dominion.
Dead men naked they shall be one
With the man in the wind and the west moon;
When their bones are picked clean and the clean bones gone,
They shall have stars at elbow and foot;
Though they go mad they shall be sane,
Though they sink through the sea they shall rise again;
Though lovers be lost love shall not;
And death shall have no dominion.

And death shall have no dominion.
Under the windings of the sea
They lying long shall not die windily;
Twisting on racks when sinews give way,
Strapped to a wheel, yet they shall not break;
Faith in their hands shall snap in two,
And the unicorn evils run them through;
Split all ends up they shan't crack;
And death shall have no dominion.

And death shall have no dominion.
No more may gulls cry at their ears
Or waves break loud on the seashores;
Where blew a flower may a flower no more
Lift its head to the blows of the rain;
Though they be mad and dead as nails,
Heads of the characters hammer through daisies;
Break in the sun till the sun breaks down,
And death shall have no dominion.

Dylan Thomas
Twenty-five Poems (1936)
http://www.dylanthomas.com/


Notas: Foi deste poeta que o Bob Dylan (Robert Allen Zimmerman) emprestou parte do nome artístico.
Esse poema é recitado pelo personagem do George Clooney na refilmagem de Solaris (2002)

sábado, 15 de agosto de 2009

Each man kills the thing he loves



Each man kills the thing he loves,
by each let this be heard.
Some do it with a bitter look,
some with a flattering word.

The coward does it with a kiss,
the brave man with a sword.
Some kill their love when they are young,
some when they are old.

Some strangle with the hands of lust,
some with the hands of gold.
The kindest use a knife because,
the dead so soon grow cold.

Some love too little,
some too long, some buy and other sell.
Some do the deed with so many tears,
and some without a sigh.
For each man kills the thing he loves,
yet each man does not die.

Oscar Wilde

Notas: Trecho da Ballada do Cárcere de Reading (The Ballad of Reading Gaol) em "De Profundis" (1987)

Poema musicado para a trilha do filme "Querelle" (1982), baseado na obra de Jean Genete e dirigido pelo cineata alemão Rainer Werner Fassbinder. Um dos pontos altos do filme é a intrepretação de "Each man kills the thing he loves" pela atriz francesa Jeanne Moreau.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Apenas um Saxofone (Trecho)



Anoiteceu e faz frio. ‘Merde! Voilà l’hiver’, é o verso que segundo Xenofonte cabe dizer agora. Aprendi com ele que palavrão em boca de mulher é como lesma em corola de rosa. Sou mulher, logo, só posso dizer palavrão em língua estrangeira, se possível, fazendo parte de um poema. Então as pessoas em redor poderão ver como sou autêntica e ao mesmo tempo erudita. Uma puta erudita, tão erudita que se quisesse podia dizer as piores bandalheiras em grego antigo, o Xenofonte sabe grego antigo. E a lesma ficaria irreconhecível como convém a uma lesma numa corola de quarenta e quatro anos."

Lygia Fagundes Telles

Nota:
O conto "Apenas um Saxofone" foi publicado no livro "Antes do baile verde" (1970) que é considerado um dos mais relevantes da carreira de Ligia Fagundes Telles.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Dream on


Every time that I look in the mirror
All these lines in my face gettin' clearer
The past is gone
It went by like dusk to dawn
Isn't that the way?
Everybody's got their dues in life to pay

I know, nobody knows
Where it comes and where it goes
I know it's everybody's sin
You got to lose to know how to win

Half my life's in books' written pages
Lived and learned from fools and from sages
You know it's true
All the things
Come back to you

Sing with me
Sing for the year
Sing for the laughter n' sing for the tear
Sing with me
If it's just for today
Maybe tomorrow the good lord will take you away

Dream on
Dream until your dream comes true

Dream on
And dream until your dream comes true

Dream on

Sing with me
Sing for the year
Sing for the laughter n' sing for the tear
Sing with me
If it's just for today
Maybe tomorrow the good lord will take you away

Steven Tyler

Notas:
Steven Tyler é o vocalista do Aerosmith. "Dream on" foi lançada no album no album de estréia desta Banda de Rock em 1973.


domingo, 2 de agosto de 2009

Às vezes as coisas dentro de nós



O que nos chama para dentro de nós mesmos
é uma vaga de luz, um pavio, uma sombra incerta.
Qualquer coisa que nos muda a escala do olhar
e nos torna piedosos, como quem já tem fé.
Nós que tivemos a vagarosa alegria repartida
pelo movimento, pela forma, pelo nome,
voltamos ao zero irradiante, ao ver
o que foi grande, o que foi pequeno, aliás
o que não tem tamanho, mas está agora
engrandecido dentro do novo olhar.

Para Maria de Lourdes Pintasilgo
em breve homenagem


Fiama Hasse Pais Brandão


Notas: O poema "As vezes as coisas dentro de nós" saiu publicado no livro "As Fábulas" de 2002.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Fiama_Hasse_Pais_Brandão